RECADO DI MINDJER GARANDI
Doka, o testemunho desta idosa reformada em portugal de visita a Guiné Bissau depois de longos anos merece ser transmitido aos nossos irmãos na Diáspora.
"Ainda não tínhamos descido do carro quando percebemos que a voz da tia ficava gradualmente mais tremula até que finalmente foi perceptível o humedecer dos olhos já desgastados e enrugados de rotina de anos de trabalho madrugador numa cidade do norte de portugal.
Mal entramos no centro da cidade de Bissau, vulgo praça, a expressão facial da nossa tia foi de consternação total.
I rapica palmo e pupa, CREDI!!!
Ficamos sem reacção, o estado das ruas empoeiradas, buracos, lama, ruas inteiras sem um único metro quadrado de asfalto, zonas em que nem se pode falar em estrada de terra batida, apenas de pedaço de terra relegado ao esquecimento pelas entidades competentes e pela Arezky, a nossa hospede reclamou que não reconhecia a sua Bissau:
Praça sta morto, nundé djinti?
Perguntas complicadas, lá tentamos esclarecer que muita gente se deslocou para lá do bairro de Hafia, explicamos que Safim e Nhacra hoje são fortemente habitadas, não convencemos, porque a reposta não se fez esperar.
Anta djintis ku ruma desde bairro até fera di bandé nundé ké ta sai? Antes de termos tempo para o que fosse a senhora rematou.
Nha fidjo bô dana é terra tudo bô kaba - Gargalhada geral.
Em nosso auxilio os vizinhos que vieram cumprimentar, algumas antigas colegas de infância, abraços, cumprimentos calorosos, nada que fizesse a senhora esquecer a mágoa pelo que restava da sua Bissau, queixumes imediatamente secundados e subscritos por uma das amigas, que entretanto se dedicara ao comercio.
Dapi anôs ke sta li nô ta sufri nan son.
Mas não é nada disso que lemos e vemos na televisão.
Tinha a ideia de que com este governo já havia Internet nas ruas, suma kê ta fala Bissau Ranka.
Fez se um silencio comprometedor, ao que a nossa hospede respondeu com um cometário sarcástico que arrancou nova gargalhada geral.
N'panha dja pé! Ma abôs tan bô ta cala son bô na sufri? ika sin dé, bô ten di papia.
Foi o suficiente para todos começarem a expressar o que lhes ia na alma, a comerciante explicou que dentro de semanas poderá ir a falência por causa das taxas que lhes estão a aplicar (parece perseguição, não percebemos), desde que a Bissau Link começou a operar, perdemos dinheiro todos os dias, não sabemos qual é a intenção duma coisa destas.
Os vencimentos já estão atrasados de novo, a luz foi sol de pouca dura, os hospitais estão piores que nunca, os bancos dizem já não ter dinheiro porque foram descapitalizados pelo Estado que os obriga a conceder empréstimos que deviam ser direccionados ao sector privado.
O anfitrião aproveitou para pedir desculpas pela condições em que recebe a tia, para além de não receber há dois meses os seus salários, não vive os seus melhor dias, foi reconduzido no cargo que ocupava já lá iam quase 8 anos, fora substituído por um jovem da entourage partidária.
Na kila, disna di nha tempo i sin, i ka na muda nunka.
O jovem neto que acabara de conhecer lá foi perdendo a timidez e começou a explicar que a televisão e o facebook são os maiores vendedores de ilusões, instrumentos de auto-promoção, desfile de vaidades, nada que surpreendesse a senhora, que complementou:
Lá tan iassim ou pior inda, alguim ta cumpra um carro i tira foto e pui na facebook, si bai restauranti i tira foto di prato, i ten utros ke ta tira foto té ao lado di carros kê ta contra kel na rua. Ma si kila kê governo sta nel é na fassi mal gora dê, porque guintis fiança ba.
Nisso o jovem volta a ter uma tirada genial: "Sabem, falar e fazer são coisas diferentes, quem faz, geralmente, fala pouco. Quem tem tempo para muita propaganda, sobra-lhe pouco para trabalhar de verdade."
A senhora regozijou-se com a lucidez do Neto (ma é ta djiro goci cedo)."
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