CARTA QUE FOI ESCRITA POR UM ALUNO DO 12º ANO AO PRESIDENTE CAVACO E GANHOU O PRÉMIO DA IMPRENSA
Albano Laranjeira |
SENHOR PRESIDENTE
Venha ver Senhor Presidente, venha conhecer o seu país, venha andar na rua, venha comigo, deixe o Mercedes na garagem, andamos a pé, eu não digo a ninguém. Venha conhecer o António, tem mais estudos que o Senhor, dorme na escada do meu prédio, oiço-o lá de cima, entra à socapa, a porta é velha, deita-se no chão, do tapete faz manta e sai de madrugada, sai tão cedo, sai com tanto medo da vassoura.
Venha ver Senhor Presidente, venha conhecer o seu país, venha andar na rua, venha comigo, deixe o Mercedes na garagem, andamos a pé, eu não digo a ninguém. Venha conhecer o António, tem mais estudos que o Senhor, dorme na escada do meu prédio, oiço-o lá de cima, entra à socapa, a porta é velha, deita-se no chão, do tapete faz manta e sai de madrugada, sai tão cedo, sai com tanto medo da vassoura.
Vamos à minha escola, no caminho encontramos a Dona, não tem nome, só Dona, roubaram-me tudo bandidos, roubaram-lhe tudo menos a voz. É velha, tão velha, senta-se no passeio, pés descalços, mentira já nem pés são, uma camada de dor preta na sola, ela tão forte, dentes não os tem, alimenta-se de cascas de laranja, não é peneira desengane-se, a laranja nunca a teve, vasculha nos lixos das redondezas, há restaurantes perto, mergulha-se quase toda lá dentro, eu a
ver e a pensar como lhe resistem os ossos não é possível não pode ser possível, mas consegue cascas, consegue sempre cascas.
Aquela ali ao fundo é a Inês, veja-lhe a magreza coitada, não tem culpa, o Senhor despediu-lhe os pais, desempregados agora comem uma vez por dia, também ela, atente-lhe na cara, quase sorridente, quase a ir para casa, quase a sopa, a sopa é sempre fria mas não faz mal, disse-me. De manhã aparece pálida, quase no desmaio, todos os dias lhe compro um bolo de arroz, ou melhor compro três, um para ela um para a mãe e outro para o pai, são boas pessoas, só podem ser,
aguentam-se fortes, aguentam-se fortes como todo o meu povo, não seu desculpe, seu talvez o território no máximo o país, não as pessoas, enquanto não as ajudar enquanto não for amigo das pessoas o povo nunca será seu o povo nunca será seu!
ver e a pensar como lhe resistem os ossos não é possível não pode ser possível, mas consegue cascas, consegue sempre cascas.
Aquela ali ao fundo é a Inês, veja-lhe a magreza coitada, não tem culpa, o Senhor despediu-lhe os pais, desempregados agora comem uma vez por dia, também ela, atente-lhe na cara, quase sorridente, quase a ir para casa, quase a sopa, a sopa é sempre fria mas não faz mal, disse-me. De manhã aparece pálida, quase no desmaio, todos os dias lhe compro um bolo de arroz, ou melhor compro três, um para ela um para a mãe e outro para o pai, são boas pessoas, só podem ser,
aguentam-se fortes, aguentam-se fortes como todo o meu povo, não seu desculpe, seu talvez o território no máximo o país, não as pessoas, enquanto não as ajudar enquanto não for amigo das pessoas o povo nunca será seu o povo nunca será seu!
Gonçalo Naves
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