quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

ESTADO DE DESGRAÇA

Estávamos em Novembro de 1980 e nada previa as possibilidades de uma mudança tão radical no País, como um Golpe de Estado.
Há que reconhecer que a situação então vigente clamava por mudanças que entretanto não passavam pela via da violência, na medida em que, eram mudanças derivadas da colisão de culturas, mentalidades e sociabilidades (forma de estar), que dificultavam a convivência entre os que estiveram na Luta de Libertação Nacional e os que sempre residiram nos centros urbanos. Este tipo de mudança requer tempo, tolerância, capacidade de diálogo entre as partes envolvidas e sobretudo um intenso exercício pedagógico, consequente e multidisciplinar, de esclarecimento e reinserção, que passa pela via da educação, formação e informação da sociedade.


Apesar das siglas que definem O P.A.I.G.C. como um Partido, na realidade era um Movimento de Libertação que reunia nas suas fileiras homens e mulheres com diferentes motivações, objectivos e percepções relativamente à essência e os ideais da própria luta e consequentemente daquilo que devia ser a construção nacional pós-independência (a ideologia, os valores, o papel do Estado e do cidadão no novo contexto emergido dos escombros de uma guerra que se prolongou por mais de uma década).


A Guiné-Bissau é um País relativamente pequeno que se celebrizou pela tenacidade, coerência e determinação com que o seu povo se dispôs à combater o colonialismo e assegurar um lugar de destaque no contexto das Nações Livres do Planeta. Este facto, tão singular pela sua natureza, granjeou ao País simpatias por todo o Mundo e as Nações amantes da Paz, do Progresso e da Libertação do homem de toda a espécie de opressão, da aventura maravilhosa que é a vida humana, de tudo o há de belo e construtivo no nosso Planeta, estenderam as mãos ao jovem Estado no período mais crítico da sua história moderna (o do lançamento dos alicerces da sua construção e afirmação).


Num período relativamente curto (1975-1980), remando contra a maré da pobreza, do profundo atraso socioeconómico e demais adversidades herdados de uma retrógrada colonização de mais de cinco séculos, o País atingiu progressos consideráveis nos sectores fundamentalmente imprescindíveis à promoção de um desenvolvimento sustentado – educação, saúde, desporto e cultura de massa, agricultura e infra-estruturas de transporte, etc., etc. – que auguravam a Guiné-Bissau um futuro próspero e risonho, graças ao nível da organização do Estado (ainda que numa fase embrionária da sua constituição), a eficácia do funcionamento das suas Instituições associados ao grau de patriotismo e a ambição dos Dirigentes Políticos. Convém salientar que nesta altura os salários eram pagos atempadamente, Bissau, à par de Kampala (capital da Uganda), era considerada a cidade mais limpa de toda a África e estava dotada de um sistema de abastecimento regular de energia eléctrica e água potável.
Como já referi, nada previa um desfecho tão violento, radical e revolucionário como o Golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, que deitou por terra todo o esforço até então empreendido com vista a gradual desmilitarização do Partido, do Governo e do próprio Estado e veio confirmar a disparidade de objectivos que motivaram a participação dos cidadãos na luta de Libertação Nacional, sobretudo no seio da cúpula dirigente do País, nitidamente dividida entre apoiantes e discordantes da ideia da Unidade Guiné e Cabo verde, que constituía a pedra angular de todo o processo de libertação.


A solução violenta revelou-se inadequada e só veio agravar ainda mais uma situação já por si muito complicada, criando um precedente extremamente perigoso, projectando mais uma vez os militares para a ribalta política e o centro nuclear da tomada de decisões, à semelhança dos tempos da Luta Armada de Libertação Nacional, ou seja, por outras palavras, os militares estavam de volta e não pretendiam abdicar da sua influência e dos privilégios que dela decorriam e em defesa dos quais nunca hesitaram em fazer crepitar as armas, gerando uma onda de violência que ao fim de quarenta anos deixou o País de rastos sem se registar nenhum progresso na resolução do problema fulcral da nossa sociedade – a definição de uma nova estratégia de construção nacional decorrente da cisão entre a Guiné e Cabo Verde.


A constante ingerência da classe castrense na vida política nacional, fez dela o principal culpado de todos os males que afectam o País e o povo clamava por mudanças políticas que pusessem termo à esta situação caótica e inconstitucional, saudando com esperança os resultados das últimas eleições gerais que simbolizam a transição geracional do Poder Político na Guiné-Bissau.
Entretanto, a actual Direcção do P.A.I.G.C., saído do seu VIII Congresso Ordinário e que por inerência e em consequência das eleições legislativas governa o País, num atípico estilo de liderança baseado no retrógrado princípio de QUERO, POSSO E MANDO, revelou-se incapaz de evitar os erros do passado e de lidar com as complexidades estratégicas e ideológicas que normalmente caracterizam Partidos da dimensão do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde, cujos problemas acabam sempre por se reflectir na sociedade e cedo a esperança do povo transformou-se em desilusão:
*O prometido Governo de excelência, cujo processo de formação foi mantido no segredo dos deuses, acabou por constituir um autêntico fiasco denominado “Governo Possível”, justificado com as alianças no VIII Congresso e as consequentes pressões exercidas sobre o Chefe do Governo – um Governo cuja composição não fugiu a regra discriminatória, arrogante e rancorosa que tem caracterizado o padrão de comportamento do actual presidente do P.A.I.G.C. e Primeiro-Ministro que persiste obcecadamente no trilho do ódio e revanchismo em relação aos militantes do seu Partido que não apoiaram a sua candidatura no Congresso.
Primando pelo total isolamento dos Quadros do seu próprio Partido, o Presidente do P.A.I.G.C. e Primeiro-ministro da Guiné-Bissau optou por aliar-se ao Partido de Renovação Social (segunda maior força política do País), assim como  às pequenas formações políticas sem expressão parlamentar, na formação do Governo, quando os resultados eleitorais atribuíam ao Partido de Amílcar Cabral o direito de governar sozinho o País, cumprindo desta forma a soberana vontade do eleitorado e assumindo as consequências que disto resultam.


Um Governo formado com base no amiguismo e clientelismo, carente de qualidade e da necessária maturidade e experiência de liderança e gestão de recursos humanos, que meses depois da sua apresentação ao público, continua sem dar sinais positivos de uma governação séria e responsável, limitando-se quase exclusivamente ao show propagandístico e promocional nas redes sociais, com o objectivo de denegrir a imagem dos representantes dos demais Órgãos da Soberania (Presidência da República e Assembleia Nacional), perseguir freneticamente os supostos adversários internos e reforçar injustificadamente os poderes do Primeiro-Ministro, provocando uma reacção natural das possíveis vítimas com o consequente “desenterrar do machado de guerra” e um desnecessário e irresponsável estabelecer de um clima de suspeição entre as partes envolvidas.
A inclusão do PRS no Governo foi justificada com a necessidade de garantir estabilidade sociopolítica ao País. Para que serve então o Multipartidarismo? Para não haver oposição? Será que vale a pena continuarmos a realizar eleições? Se o PRS devia de facto ser incluído no Governo, porquê que não reivindicou 40% de todas as pastas governativas, correspondentes a percentagem de votos que obteve do eleitorado? E o quê que justifica a inclusão de Partidos sem assento parlamentar no Governo em detrimento dos Quadros do P.A.I.G.C.? Amiguismo e clientelismo!!! Acontece que, utilizar a máquina do P.A.I.G.C. para ganhar eleições com maioria absoluta para depois preterir os seus Quadros em prol de amigos e familiares que, enquanto militantes dos seus respectivos Partidos organizaram campanhas contra o próprio P.A.I.G.C. terá um custo muito elevado.
“Cada povo tem o Governo que merece!” Mas o nosso povo merecia muito mais do que um Governo de operações cosméticas, sobretudo em Bissau, “para o senegalês ver”; um Governo de declarações de meras intenções para acalentar a esperança do povo e prolongar a sua própria agonia (luta para atingir os objectivos do milénio, organização de uma mesa redonda de doadores internacionais para ajudar a Guiné-Bissau, etc., etc.), quando a situação vigente requer respeito pelo emanado na Constituição, assim como pelas regras e regulamentos inerentes a sua aplicação. De facto, o fulcro do conflito institucional que hoje se vive na Guiné-Bissau resulta sobretudo da postura arrogante que o Presidente do P.A.I.G.C. e Primeiro-Ministro adopta face as pessoas do actual Presidente da República e do Presidente da Assembleia Nacional e esta situação caótica e intolerável deve ser constitucionalmente resolvida o mais rapidamente possível, para o bem de todos e para que o nosso País não seja mais uma vez adiado por razões que não se justificam.


A compreensão de todo este emaranhado conjunto de factores que mais uma vez ameaçam a paz e a estabilidade na Guiné-Bissau exige uma análise profunda e paciente que certamente não está ao alcance de todos. Entretanto o nosso povo é unânime a concluir que se o actual Presidente da República e o actual Primeiro-Ministro invertessem de posição, DSP não hesitaria em exonerar JOMAV, alegando incompatibilidade pessoal, colocando-o por conseguinte a disposição de um Ministério Público por ele controlado que se incumbiria de o destruir moral e politicamente, tanto é o ódio e desprezo que por ele nutre. 

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