Epá, estão aqui algumas verdades interessantes vale a pena ler, porque eu Doka fiquei curioso agora.
Leiam.
O historiador guineense Mário Sissoko revelou na grande entrevista da semana, de O Democrata, que o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) não existia até 1960 e que três de Agosto de 1959, o massacre de Pindjiguity, não fora também da autoria do partido libertador da Guiné-Bissau.
Ainda nas suas palavras houve, na altura, uma decisão de aumentar salário dos Marinheiros dos Portos de Bissau, mas aconteceu que os referidos Marinheiros deslocaram ao Chão Manjaco a procura de paus para confeccionar remos de Pirogas e um deles fora ameaçada por um cão do Administrador António Carreira que na altura reformara e residia na vila de Canchungo. O Marinheiro atingiu mortalmente o referido cão. O que levou António Carreira a atrasar com o processo de aumento de salário, porque ficara mal com o facto de o Marinheiro ter morto o seu cão de estimação. Assim, foi em reacção a esta atitude de António Carreira que desencadeou a revolta de 3 de Agosto, em 1959, onde morreram nove pessoas.
Disse ainda que o próximo congresso do PAIGC será “um congresso de decotados”, pois será para “os meninos bonitos” e não pautará pela promoção da competência, com vista a permitir o mais capaz dirigir o partido com a participação de todos militantes e dirigentes do PAIGC.
Mário Sissoko diz não estar contra alguém em especial. É um simples historiador que enveredou pela investigação e não significa, de forma alguma, que tudo nele seja perfeito. Por isso, não tem conhecimento da existência da revolta dos Marinheiros, em 1959. E mais: que a história do roubo de óculos de Amílcar Cabral por um dos seus confrades foi uma invenção para o poder prender na altura.
DEMOCRATA (D): O país acaba de celebrar mais uma data do início da luta de libertação. Enquanto historiador acha que havia necessidade de se fazer a luta?
MÁRIO SISSOKO (MS): Como se pode considerar um indivíduo fundador da nacionalidade se esse mesmo indivíduo é um sujeito colonial e cidadão desde o ventre da sua mãe. Historicamente não existem provas palpáveis. Antes da formação da nascença da história da Guiné-Bissau, no desembocar da Conferência de Berlim entre 1884-1885, que partilhou África e o resto do mundo, o pacto da Guiné ainda não tinha terminado e só aconteceu a 02 de Maio de 1886, com a permuta territorial entre a França e Portugal.
Portugal tinha posto em leilão todas as suas colónias, porque a maior preocupação de Portugal era justamente o seu mapa de côr- de-rosa (Moçambique e Angola), devido o medo que tinha dos Interesses e visões expansionistas dos Estados Unidos da América e da Alemanha, os quais pretendiam criar uma África Germânica, juntando zanzibar até Namíbia, incluindo os territórios e as colónias de Ruanda com Burundi, com uma hipótese de chegar aos Camarões e Togo, para além dos interesses também da Inglaterra.
A Guiné Portuguesa, no meio do oceano francófono, obrigou Portugal a colocar em leilão uma parte do território que ocupava a favor da França. Porque entendia que corria sérios riscos de perder esta parte, decidiu, por conseguinte, trocar com a colónia francesa em como pudesse salvaguardar a sua posição de ocupação, mas foi-lhe difícil. Nesta altura, França que estava já na eminência de um conflito surdo e mudo com o Reino-Unido avançou, de imediato, para o norte da Guiné Portuguesa, Casamança. E, em compensação, dar uma parte da confederação Nalú, Landumá Baga, Temené, no noroeste da Guiné–Conakry com o intuito de sanduichar a Guiné. Foi, a partir desde momento, que a luta de libertação começou. Porque, depois da assinatura da convenção franco-portuguesa de 1886, que ditou a partilha da África e o resto do mundo é que se iniciaram as reivindicações com a luta armada. O Norte (Casamança) reivindicou. Eu, enquanto pesquisador e historiador, situo a luta da libertação, a partir desta altura. Foi uma estratégica da França, sanduichar a Gâmbia Britânica e a Guiné Portuguesa, pequenos territórios, pensando que posteriormente com a sua influência económica e linguística poderia deglutir e contribuir para o enfraquecimento da posição de Portugal na África Ocidental. Portanto, se é desta forma que a luta começou com nascimento do território, conclui-se que dominação de quinhentos anos da Guiné Portuguesa é um argumento falso que carece de documentos comprovativos.
Na era Luís Cabral, referi esta parte. E houve insultos na rádio na altura contra a minha pessoa. Um jornal português que existia nesta altura denominado de “ O Século”, difundiu as minhas palavras. Depois da difusão do meu discurso, fiz uma chamada de atenção para revistarem o número especial do Boletim Cultural, as efemérides que Teixeira da Mota colocou na primeira página para as comemorações do quinto centenário da descoberta da Guiné, não quinto centenário da documentação. Tudo isso, não passa de política. Porque era do conhecimento do mundo que a Guiné não era um país, é um Estado constituído por seus reinos. A partir da queda da monarquia portuguesa em 1910, Portugal entrou para ciclo de instabilidades, o que terá provocado a aceitação da Liga Guineense, criada igualmente em 1910 e oficializada no Boletim da Guiné Portuguesa em 1911.
D: Houve vários movimentos que tiveram reivindicações nacionalistas. O que permitiu ao PAIGC tornar-se movimento incontornável do processo?
MS: Na Guiné-Bissau estavam régulos de todas as etnias, alfaiates e empregados comerciais. Existem documentos. Pai da Cármen Pereira era representante da Guiné no Partido Nacional Africano e, igualmente, encarregado do jornal da parte guineense “ Ecos da Guiné”. Nos anos de 1935, havia africanos (pretos), guineenses e mestiços que foram, pela segunda vez, participar na Cimeira Internacional Socialista realizada na ex-União Soviética. Documentos comprovativos para isso existem e podem ser encontrados nos arquivos da Torre do Tombo. Em 1938, com seu regresso, criou-se o Partido Socialista, não estou a inventar, tudo pode ser comprovado através dos documentos da PIDE.
Em 2004, fomos participar em Angola, num colóquio sobre as histórias de lutas de libertação nos Países Africanos da Língua Oficial Portuguesa (PALOP). Encontrei uma historiadora, cuja tese de Doutoramento do terceiro ciclo assentava-se sobre a PIDE/DGS relativamente a guerra colonial, na qual mencionou alguns documentos da PIDE sobre a evolução política e a existência de algumas organizações na Guiné. Mas nesta tese, estranhamente não apareceu PS-Partido Socialista. Não sei se foi extinto por razões da guerra fria, depois da Segunda Guerra Mundial ou se terá sido por causa da influência da Alemanha sobre Portugal ou ainda pela insegurança nas colónias Portuguesas. Se for esta a razão, mesmo o Partido Comunista também tinha idênticos problemas a ponto de criar Movimento da Unidade Democrática. Quer dizer, existiam núcleos nacionalistas, quer para autodeterminação, quer para a independência. Mas sempre ligados ao Partido Comunista português, sob apoio do Partido Socialista francês. E a equipa que foi à Conferencia da União Soviética sobre Partido Socialista nos anos 30 do século XX, foi financiada justamente pelo Partido Comunista francês.
Depois disso, veio o Movimento da Libertação da Guiné (MLG) e com o evoluir das coisas, seguiu-se até a Guiné-Conakry. Na altura, o Secretário para as Relações Exteriores era José Lacerda, pai do António Lacerda. Tinha ainda o João Rosa, igualmente Representante da CFAO, Companhia Francesa da África Ocidental, Rafael Barbosa, Secretário de Propaganda e das Massas. Talvez estas funções podem ter contribuído na promoção da sua imagem por ter estado em contacto permanente com a massa, mas estavam no movimento, brancos, pretos e mestiços muito bem conhecidos como Mário Lima Gomes Wanó e outros.
D: Foram nestas circunstâncias que o PAIGC nasceu?
MS: Em todas as pesquisas feitas por mim, o PAIGC não existia até antes de 1960. Mesmo 3 de agosto de 1959, não foi de autoria do PAIGC. Havia uma decisão de aumentar salário aos marinheiros do Porto. Acontece que um dia destes os Marinheiros se deslocaram ao chão dos Manjacos, a procura de paus para confeccionar remos e um deles foi ameaçado pelo Cão do António Cadeira, reformado e residente em Canchungo, o qual foi atingido mortalmente por um dos Marinheiros. Este senhor começou a atrasar com o processo de aumento de salário, porque talvez tinha ficado mal com a resposta dos estivadores. E, em reacção a atitude de António Cadeira, morreram em 1959, nove (9) pessoas, segundo arquivo histórico-militar português.
D: Será que o poder colonial, na altura, estaria tão interessado em revelar o número exacto dos mortos?
MS: Atenção, Portugal estava muito mal. Havia Movimento Democrático, Salazar estava esgotado e gozava apenas do suporte da PIDE. Portanto, havia muitos problemas ao ponto de Portugal ficar isolado, senão, Humberto Delgado não candidataria. As Nações Unidas, através de uma resolução, exigiram que os países colonizadores preparassem todas as suas colónias económica, cultural e politicamente, etc, num período de dez anos, antes de as deixarem. Foi, a partir desta altura, que Portugal começou a mudar de posição afirmando que não tinha colónias, apenas províncias. Nestas circunstâncias era normal que um regime colonial não fizesse relatório por sua conta própria, mas há testemunhas e até o Presidente português depois de António Espínola, Costa Gomes, Sub-Secretário da Aeronáutica portuguesa, na sua deslocação à Angola fez escala aqui no nosso país. Mobilizou comandos para o Aeroporto. Mas estes foram sem armas para o receberem com tiros de honra, uma tarefa desencadeada depois pelos Cepaios.
D: Há informações que indicam que antes do massacre de 03 de agosto de 1959 houve uma outra manifestação. Comenta?
MS: Não é do meu conhecimento, mas que eu saiba houve manifestação entre os Pepeis e Mancanhas na Feira da Praça que resultou em ferimentos de pessoas, reflexo da situação que a Guiné vivia na altura. Mas Portugal não tinha todo o território sob seu controlo, facto que o terá obrigado a reconhecer o poder tradicional antigo existente, antes do poder colonial português para poder ter monopólio do povo guineense. Voltando ao PAIGC, depois da deslocação das pessoas à Guiné-Conakry foram encontrados núcleos nacionalistas das outras colónias portuguesas, de Cabo-Verde, de Angola e do Moçambique. Estas pessoas informaram a Bissau da existência dos núcleos. Em 1960/61, criou-se MLGCV, Movimento de Libertação da Guiné e Cabo-Verde e a Frente de Libertação da Guiné Portuguesa e as Ilhas de Cabo-Verde com objectivo de fazer uma frente comum. Amílcar Cabral foi indigitado de Bissau à Conakry para aderir ao Movimento, simplesmente rejeitou, talvez porque, nesse momento, todos se conheciam, sobretudo, na dita sociedade civilizada em Bissau. Depois de desacertos no seio dos membros do Movimento, Luís Tchalumbé comunicou ao Rafael Barbosa para informar ao José Lacerda que havia necessidade de se enviar credencial, devido à confusão que se vivia em Conakry. Cadi Djaló (faleceu), comissária de Trânsito e responsável pela telecomunicação na altura em Bissau foi quem levou credencial que foi entregue ao Rafael Barbosa e um enfermeiro Ladislau de onde foi apagado o nome de Luís da Silva (Luís Tchalumbé) com uma substância e colocaram nome do Amílcar Cabral, argumentando que era guineense, africano, mas cedo não foi reconhecido. Algumas pessoas de Geba, por intermédio do Edmundo Dundo Fernandes, que se encontrava na administração da região de Bafatá, conseguiram um registo de nascimento (falso ou verdadeiro), que foi atribuído ao Amílcar Cabral como filho da Guiné-Bissau para justificar credencial. Havendo tudo isso, Sékou Touré ordenou para pôr fora todas as pessoas que não aceitaram aderir às iniciativas de Amílcar Cabral.
Tenho certeza que o programa político do PAI feito em Guiné-Conakry, teve mão dos Nánias que se encontravam na Guiné-Bissau. Porque sempre defenderam (Guineenses de Conakry), que a mãe de Amílcar Cabral era fula e por solidariedade étnica, Seifo lai Djaló terá ajudado a concretizar planos de Cabral. Alguns elementos do MLG, discordantes, espalharam demarcando. Uns pela Serra-Leoa e outros no Senegal (Casamança). Criou-se a FLING e, em seguida, iniciou-se a luta de libertação no norte de Santchabá, sector de São Domingos, em 1960/61. Frequentando a escola no Liceu Guinhabó Bigoló (colégio normal), segui primeiros tiros de armas do início da luta de libertação e só mais tarde, em 1966, saí de lá.
D: Por que é que não aderiu outros movimentos para além do PAIGC?
MS: Eu estava revoltado com a decisão da direcção do Liceu de Ziguinchor que atribuiu o concurso internacional de redacção aos estudantes originários da antiga colónia francesa em África. Eu e mais meu colega, Bapa Crade não aceitamos tomar parte e de vez em quando éramos castigados com sessões de estudos. Nesta altura, eram colados panfletos, mesmo assim não aderi ao concurso. Em 1963, em meados de Agosto, fui mobilizado por Queba Dabó quando tinha transitado para o décimo ano de escolaridade. Seguimos para Farim e encontramos Indjai Bá, encarregado de “Maison de Jeunes du Ziguinchor”, no antigo campo de futebol. PAI, com toda segurança, foi a partir deste conflito de Santchabá, sector de São Domingos que surgiu. Depois das divergências vividas no MLGC, antes de FLING, Amílcar começou a procurar aderentes e foi, a partir deste momento, que ele próprio Cabral viajou a Ziguinchor e realizou primeira reunião em 1962, na residência de Indjai Bá ao pé da mesquita central em direcção ao Santchabá, mas que, no entanto, não teve resultados bons, devido a falta de entendimento. Na reunião, estiveram presentes Bapa Lite, ex-irmão do Manuel Saturnino Costa, Mamadu Cantcham Camará (de RDA da Guiné Portuguesa) e uma mulher de nome Obidjara foram presos. Estavam os nove (9) partidos, organizações nacionalistas, UPG de Pipi Pereira, que não se entenderam. Primeiras armas chegaram da OUA com assinatura de François Kankola Mendy. No segundo encontro, realizado em Dakar, na presença do jovem cônsul-geral português, Gonzaga Ferreira, estiveram lá de novo, Papa Lite, Amílcar, Gazela (falecido) com a intenção de criar uma frente comum com duas hipóteses, independência pacífica ou independência por via das armas. Os nove (9) partidos, organizações nacionalistas com o rebentamento do MLG, cenário repetiu-se e até mais ainda do que o da Guiné-Conakry, acabando na criação de um outro Movimento “No riba kasa”. Na sequência de tudo isso, alguns decidiram ficar no Senegal e o Rafael viajou com a maleta do MLG e foi entregá-la ao Luís Cabral, um assunto que acabaria quase no seu espancamento. Porque tinha transportado consigo dezassete (17) mil escudos da Guiné para o encontro de Baobab (Senegal), informações que o próprio Rafael transmitiu aos elementos no encontro e que gravamos. Depois dele, Amílcar Cabral, foi ao terreno e não aceitou a proposta, mas o voto da maioria caiu no pensamento defendido pelo Léopold Sédar Sénghor e Amílcar abandonou a cimeira. Gonzaga Ferreira, cônsul-geral de Portugal em Dakar, informou Lisboa sobre ambiente vivido na conferência. Desde então, Professor Benjamim Pinto Bull (falecido) passou a chefiar as delegações das nove organizações políticas guineenses para a independência da Guiné. Na sua primeira deslocação a Portugal, o grupo foi recebido pelo Salazar e inclusive, pelas informações, Portugal tinha aderido a ideia de independência por via pacífica. Todavia, como GCE, parte que contestou o resultado da cimeira teve que levar muitas pessoas para cadeia para poder evitar o problema que se vivia no Senegal, porque Senghor também lutava contra o PAI do Senegal com consonância política comunista do PAI da Guiné.
D: Como explica esta situação de Amílcar Cabral ter criado um Clube Desportivo na Guiné, a revolta em 1959 e o roubo de seus óculos?
MS: Não conheço revoltas em 1959, nem estou contra alguém. Sou historiador e, tal como homem que se enveredou pela investigação, não significa de forma alguma que tudo em mim é perfeito. Mesmo esta história de roubo de óculos foi só uma questão de invenção para o prender. Rafael, na sua pessoa, faz posição do Cabral e o problema do Rafael e com a família de Amílcar é um problema adulto. Pai do Rafael tinha apelido Cabral e o próprio Rafael tinha Cabral, mas não se apresenta com apelido Cabral. Portanto, uma afinidade que chegou a ser tão forte ao ponto de Rafael Barbosa tornar-se genro de Juvenal Cabral.
D: Depois de 40 anos da morte de Cabral e 50 anos de início da luta de libertação assinalados recentemente, podia deixar aqui a sua análise sintética sobre estes dois acontecimentos em comparação à situação actual do país…
MS: Não se pode fazer uma análise da situação actual sem falar dos condicionantes da actual situação. É preciso ter um olhar atento ao passado, pois uma luta nacional é sempre uma congregação de sensibilidades, organizações e movimentos. O próprio Amílcar Cabral que, pela primeira vez, partidarizou do Movimento a partir de Cassacá, no qual o congresso nacional teve nome Cassacá, afirmava sempre que, “nem toda agente é militante do partido”. Ora, se todos os comandantes e Anciões que estavam no encontro fossem todos do PAI, Cabral não discursaria de tal forma. A Coabitação foi difícil, porquanto faltou um trabalho político profundo. O que facilitou a adesão dos guineenses é a sua característica antropóloga formatada para o seu Curriculum doméstico, não de ir a escola. Há uma certa solidariedade, aspecto que nos diferencia de outros povos da África Central, como Grandes Lagos, Burundi, Ruanda, por aí fora, Angola e Moçambique.
A título de exemplo, se repararem bem, desde a libertação, a ordem do dia a ser discutida no próximo Conselho de Ministros, vem à rua antes da reunião, portanto, é essa característica do guineense.
D: O que é que deu, depois tanta força ao PAIGC, ao ponto de Cabral passar também a ser uma figura incontornável não só para PAIGC, bem como a movimentos do terceiro mundo?
MS: Isso tem a ver com duas etapas. A primeira etapa interna e a segunda externa. Etapa interna, em Conakry, o MLG enfrentou dificuldades, o que levou a criação do MLGC e mais tarde MLGCB. Cabral levou dez mil dólares para Guiné-Conkcry, segundo fontes, família Trupin identificou-se logo com Cabral, porque pessoas que saíram de Bissau passavam fome e este homem aproveitou lançar a corrupção. Fala-se tanto da corrupção no PAIGC, o pai da corrupção no partido é o próprio Amílcar Cabral. Não dava dinheiro por gostar destas pessoas, mas dava para as puxar. Uma vez, o primeiro grupo que tinha aderido ao grupo de Amílcar encontrou-se com o segundo num restaurante, lançaram-se a muros. Mais tarde, o grupo abandonou a localidade de Sandrawalia e foi alugar um lar. Portanto, havia falta de maturidade nas pessoas e Nino era chamado de Morcego, porque não era visto de dia só aparecia à noite.
D: Mas tudo isso não tinha a ver também com a inteligência do próprio Cabral?
MS: Não. Repara, esses indivíduos não tinham um nível académico elevado. Eram os chamados assimilados e Cabral tinha grau superior. Aristides também era de nível baixa apenas tirou curso técnico de telecomunicações. Amílcar teve sorte, porque a sua ideologia política identificava – se com a linha do comportamento político do Ahmed Sékou Touré de Conakry – e este, por sua vez, conseguiu facilitar, porque também tinha boa relação com grandes líderes revolucionários da África, fundadores da OUA, como Mohamed V, pai do Assan II de Marrocos, Kwame Nkrumah de Ghana, Jomo Kenyatta do Quénia, Julius Kambarage Nyerere da Tanzânia, Kenneth Kawnda da Zâmbia, Mama Samba Debó do Congo entre outros líderes africanos, incluindo historiadores senegaleses que se refugiaram para Conakry, devido a política de Senghor e juntaram-se ao Sékou Touré, rejeitado por França. Ahmed Sékou Touré, por exemplo, não tinha essa política comunista, mas era sindicalista estratégico. Conseguiu influenciar e muito a actuação e formação do Cabral e até mesmo na condução dos assuntos políticos da Guiné, pois era um terreno fértil para ele. Tudo isso foi a nível interno. No plano Internacional, só Eduardo Mondlane era universitário e funcionário das Nações Unidas, então a revolução decorreu sob ritmo universitário da intelectualidade, enquanto Portugal ganhava terreno em Moçambique. Em Angola, Mário de Andrade mais um colega dele foram afastados do MPLA e rejeitados, porque eram considerados brancos. Mas, isso era o resultado dos problemas que se viviam também em Angola através de dois estrangulamentos.
Primeiro, porque os de norte e os do sul não se davam bem e várias vezes temos de intervir na ex-União Soviética para sanar divergências entre os estudantes do norte e os do sul na altura, mas todos do MPLA, da mesma organização partidária. Segundo estrangulamento, foi justamente a classe política do MPLA, os cremes (mestiços), que ajudou Amílcar a progredir. Estes mestiços eram identificados por angolanos com o regime colonial, por isso o MPLA não tinha uma força política consistente e nasceu UPA e mais tarde a UNITA, todos eles movimentos negros.
D: Durante alguns anos colaborou com Amílcar Cabral e, neste momento, apresenta-se como um dos críticos a esta figura. Tinha algum conflito com Cabral?
MS: No comité da secção dos estudantes do partido na União Soviética, SEP, só estavam os estudantes da associação dos estudantes da Guiné e Cabo-Verde do PAI, para além destes não havia nada mais. Eu enquanto responsável pelas finanças e problemas académicos, Cabral solicitou-me uma vez para responsabilizar da sua filha em 1968, mas numa reunião onde estavam figuras como Fernando Cabral, Paulo Medina e companhia limitada, Fernando Djibril fez a proposta de eu não assumir essa responsabilidade no SEP, porque era mais novo e com limitações na língua e que seria necessário ganhar mais experiencias para, no futuro, conhecer outras organizações estudantis da Europa, África e da Ásia. Em 1970, assumi plenamente as funções e, desde então, jamais consegui chegar às 08 horas às aulas. Sempre andei a resolver os problemas de vária ordem, do nível da escolaridade, pessoais, etc. Havendo cada vez mais problemas ligados a níveis de escolaridade tive que fazer voltar muitas pessoas para Guiné. Mais tarde descobri que grosso número deles era afinal agente da segurança, os informadores, talvez pode ser este o motivo que, em 1972, Cabral criticou-me fortemente.
D: Como é que analisa afirmação do jornalista José Pedro Castanheira que afirma no seu livro que Amílcar Cabral foi morto por militantes do PAIGC da Guiné-Bissau?
MS: Aristides Maria Pereira, Secretário-Geral do PAIGC na Guiné-Conakry, era adjunto de Amílcar Cabral, chefe dos serviços da secreta e Oto Chartte, era seu adjunto, todos cabo-verdianos. Enquanto figuras próximas do Cabral, por que é que não travaram o assassinato de Amílcar e tomar medidas contras essas pessoas? Será que não sentiram que se tal não tivesse acontecido a situação não os favorecia, porque eram minoria talvez? Por que é que não se levantou a questão da inacção da secreta dirigida por Aristides Maria Pereira para desmantelar a operação? Será que não se pode dizer que a inactividade da secreta, foi ou não um golpe palaciano?
Na altura quem tinha a ideia diferente a dos Cabo-verdianos, era logo tratado de inimigo de Cabo-Verde. Se a tese de Amílcar Cabral fundamenta-se essencialmente sobre o papel da cultura, por que é que os seus sucessores, Aristides Maria Pereira e Luís Cabral fecharam o Museu? Talvez tenham lembrado das indicações deixadas por Amílcar Cabral, que a cultura é um factor conspirativo e de libertação. Ou talvez entendeu-se que o povo guineense vendo o seu Museu étno-histórico a funcionar poder-lhe-ia servir no futuro de referência para reagir face as matanças sistemáticas cometidas e prisões ilegais sem advogados.
Será que eram fiéis ao Amílcar Cabral, iam estragar a memória de Cabral sobre a vertente cultural? Por que é que, em Cabo-Verde, foram conservados todos os monumentos históricos e até avenidas coloniais foram igualmente conservadas e na Guiné-Bissau nada disso restou. Luís Cabral chegou a fazer proposta com perícias do Breda-UNESCO, para a elaboração de um projecto sobre a lei de protecção do património cultural, nada foi feito até 14 de novembro de 1980. Portanto, Octo Chardt foi morto, porque alguém receava que pudesse um dia dizer ao público o seu segredo.
Depois da morte de Cabral produziu-se uma lista de centenas de pessoas até inocentes foram executadas, outras foram queimadas. Chamavam as pessoas, um por um, como foi com o caso de 17 de outubro em Bissau e todos eram filhos da Guiné-Bissau, nenhum Cabo-Verdiano.
D: O relatório sobre a morte de Cabral chegou ser apresentado publicamente?
MS: Está nos serviços da segurança guineense, no Ministério do Interior, se não for roubado, incluindo o dos guineenses mortos na sequência da morte do Amílcar Cabral.
D: Como considera o Cabral?
MS: Cabral é um grande estratégico e históricamente não se pode negar isso. Também soube aproveitar os homens que tinha ao seu dispor e, muitas das vezes, mesmo na sua ausência, os seus homens conseguem executar correctamente os planos no terreno e sem grandes dificuldades.
D: Será que a sua liderança não influênciou o processo da luta?
MS: Sabemos que todos os relatórios são dirigidos por ele e para depois o Conselho da Guerra venha decidir. Conheço o Cabral um pouco e ele não me faz mal. Mas vocês também podem se questionar: Como morreu o comandante Domingos Ramos? Fizeram muitas invenções sobre a morte de Domingos Ramos e dizem isso e mais aquilo. Domingos Ramos, Paulo Correia e mais outros camaradas fizeram exército colonial. Imaginam uma pessoa com a experiência militar vai utilizar o morteiro 60 numa distância de menos de 200 metros. Bem eles é que dizem e há que esclarecer muitas coisas nesta terra.
D: O que acha que pode ser feito a fim de permitir ao país sair da situação em que se encontra?
MS: Para o nosso país sair da situação instabilidade e de cíclicos sobressaltos, acho que temos que organizar uma grande conferência nacional de reconciliação entre os guineenses e na qual as pessoas irão confessar aquilo que fizeram e, para depois, serem amnisteados dos crimes cometidos. A realização de uma conferência nacional de reconciliação é a única via para resolução dos problemas, mas atenção: não se pode ser dirigida por pessoas implicadas nos problemas que passaram neste país ou as pessoas pertencentes a algumas organizações e que já estão afectadas das sujeiras dos problemas deste país. A conferência deve ser dirigida por pessoas neutras de todos os problemas que passaram na Guiné-Bissau e que não estão implicadas em nenhum acto de corrupção, porque conhecemo-nos todos aqui e sabemos todos quais são as pessoas sujas neste país.
D: Que leitura faz sobre o congresso do PAIGC agendado para o próximo mês de Maio?
MS: Será um congresso de decotados, ou seja, vai ser feito para os meninos bonitos. Mas agora se a partir do momento existirem meninos bonitos e será que haverá a justiça? Para já não vai pautar pela promoção da competência, a fim de permitir o mais capaz dirigir o partido ou através da participação de todos os militantes e dirigentes.
D: Passaram muitos assassinatos neste país. Acha que a justiça guineense será capaz de trazer a luz do dia os responsáveis desses actos?
MS: Acho que é dificil, mas as autoridades judiciais têm que ter a coragem de fazer vincar a justiça. Digo que isso vai ser difícil se tomarmos em conta o nível da corrupção que se regista no sector da justiça e por isso aposto na realização de uma conferência nacional de reconciliação, onde os responsáveis de sucessivos actos dos crimes terão a coragem de confessar aquilo que fizeram, para depois serem amnisteados pelo povo.
D: Há vozes que indicam que os chefes relegiosos deveriam ser incumbidos a tarefa da realização da conferência nacional de reconciliação, dado que são neutros de todos os problemas. Compartilha essa ideia?
MS: Vários chefes religiosos são corruptos e sei disso muito bem. Como é que vão confiar os chefes relegiosos essa tarefa se a própria sociedade desconfia dos mesmos pelos actos da corrupção. Os chefes relegiosos que fazem desvios dos donativos para os seus interesses pessoais, prejudicando a sociedade.
D: As Forças Armadas hoje são um problema para a Guiné-Bissau?
MS: Não. As pessoas que hoje estão nas forças armadas uma boa parte são meninos que assistiram os sacrifícios que os seus pais (combatentes) passaram nesta terra. Será que vão admitir ou aceitar que os políticos brinquem com eles da mesma forma? Os sucessivos governantes tratam os combatentes como escravos e até têm a coragem de os pagar um salário mensal de 15 mil francos CFA. Nesta situação, acham que as pessoas que estão a liderar as forças armadas vão admitir falta de respeito desses bandidos. Porque sabem como é que os seus colegas foram tratados e, por isso, muitos combatentes não querem ir a reforma e prepeferem ficar no quartel para ganhar um pouco de salário.
Por: Assana Sambú/Filomeno Sambú
Leiam.
O historiador guineense Mário Sissoko revelou na grande entrevista da semana, de O Democrata, que o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) não existia até 1960 e que três de Agosto de 1959, o massacre de Pindjiguity, não fora também da autoria do partido libertador da Guiné-Bissau.
Ainda nas suas palavras houve, na altura, uma decisão de aumentar salário dos Marinheiros dos Portos de Bissau, mas aconteceu que os referidos Marinheiros deslocaram ao Chão Manjaco a procura de paus para confeccionar remos de Pirogas e um deles fora ameaçada por um cão do Administrador António Carreira que na altura reformara e residia na vila de Canchungo. O Marinheiro atingiu mortalmente o referido cão. O que levou António Carreira a atrasar com o processo de aumento de salário, porque ficara mal com o facto de o Marinheiro ter morto o seu cão de estimação. Assim, foi em reacção a esta atitude de António Carreira que desencadeou a revolta de 3 de Agosto, em 1959, onde morreram nove pessoas.
Disse ainda que o próximo congresso do PAIGC será “um congresso de decotados”, pois será para “os meninos bonitos” e não pautará pela promoção da competência, com vista a permitir o mais capaz dirigir o partido com a participação de todos militantes e dirigentes do PAIGC.
Mário Sissoko diz não estar contra alguém em especial. É um simples historiador que enveredou pela investigação e não significa, de forma alguma, que tudo nele seja perfeito. Por isso, não tem conhecimento da existência da revolta dos Marinheiros, em 1959. E mais: que a história do roubo de óculos de Amílcar Cabral por um dos seus confrades foi uma invenção para o poder prender na altura.
DEMOCRATA (D): O país acaba de celebrar mais uma data do início da luta de libertação. Enquanto historiador acha que havia necessidade de se fazer a luta?
MÁRIO SISSOKO (MS): Como se pode considerar um indivíduo fundador da nacionalidade se esse mesmo indivíduo é um sujeito colonial e cidadão desde o ventre da sua mãe. Historicamente não existem provas palpáveis. Antes da formação da nascença da história da Guiné-Bissau, no desembocar da Conferência de Berlim entre 1884-1885, que partilhou África e o resto do mundo, o pacto da Guiné ainda não tinha terminado e só aconteceu a 02 de Maio de 1886, com a permuta territorial entre a França e Portugal.
Portugal tinha posto em leilão todas as suas colónias, porque a maior preocupação de Portugal era justamente o seu mapa de côr- de-rosa (Moçambique e Angola), devido o medo que tinha dos Interesses e visões expansionistas dos Estados Unidos da América e da Alemanha, os quais pretendiam criar uma África Germânica, juntando zanzibar até Namíbia, incluindo os territórios e as colónias de Ruanda com Burundi, com uma hipótese de chegar aos Camarões e Togo, para além dos interesses também da Inglaterra.
A Guiné Portuguesa, no meio do oceano francófono, obrigou Portugal a colocar em leilão uma parte do território que ocupava a favor da França. Porque entendia que corria sérios riscos de perder esta parte, decidiu, por conseguinte, trocar com a colónia francesa em como pudesse salvaguardar a sua posição de ocupação, mas foi-lhe difícil. Nesta altura, França que estava já na eminência de um conflito surdo e mudo com o Reino-Unido avançou, de imediato, para o norte da Guiné Portuguesa, Casamança. E, em compensação, dar uma parte da confederação Nalú, Landumá Baga, Temené, no noroeste da Guiné–Conakry com o intuito de sanduichar a Guiné. Foi, a partir desde momento, que a luta de libertação começou. Porque, depois da assinatura da convenção franco-portuguesa de 1886, que ditou a partilha da África e o resto do mundo é que se iniciaram as reivindicações com a luta armada. O Norte (Casamança) reivindicou. Eu, enquanto pesquisador e historiador, situo a luta da libertação, a partir desta altura. Foi uma estratégica da França, sanduichar a Gâmbia Britânica e a Guiné Portuguesa, pequenos territórios, pensando que posteriormente com a sua influência económica e linguística poderia deglutir e contribuir para o enfraquecimento da posição de Portugal na África Ocidental. Portanto, se é desta forma que a luta começou com nascimento do território, conclui-se que dominação de quinhentos anos da Guiné Portuguesa é um argumento falso que carece de documentos comprovativos.
Na era Luís Cabral, referi esta parte. E houve insultos na rádio na altura contra a minha pessoa. Um jornal português que existia nesta altura denominado de “ O Século”, difundiu as minhas palavras. Depois da difusão do meu discurso, fiz uma chamada de atenção para revistarem o número especial do Boletim Cultural, as efemérides que Teixeira da Mota colocou na primeira página para as comemorações do quinto centenário da descoberta da Guiné, não quinto centenário da documentação. Tudo isso, não passa de política. Porque era do conhecimento do mundo que a Guiné não era um país, é um Estado constituído por seus reinos. A partir da queda da monarquia portuguesa em 1910, Portugal entrou para ciclo de instabilidades, o que terá provocado a aceitação da Liga Guineense, criada igualmente em 1910 e oficializada no Boletim da Guiné Portuguesa em 1911.
D: Houve vários movimentos que tiveram reivindicações nacionalistas. O que permitiu ao PAIGC tornar-se movimento incontornável do processo?
MS: Na Guiné-Bissau estavam régulos de todas as etnias, alfaiates e empregados comerciais. Existem documentos. Pai da Cármen Pereira era representante da Guiné no Partido Nacional Africano e, igualmente, encarregado do jornal da parte guineense “ Ecos da Guiné”. Nos anos de 1935, havia africanos (pretos), guineenses e mestiços que foram, pela segunda vez, participar na Cimeira Internacional Socialista realizada na ex-União Soviética. Documentos comprovativos para isso existem e podem ser encontrados nos arquivos da Torre do Tombo. Em 1938, com seu regresso, criou-se o Partido Socialista, não estou a inventar, tudo pode ser comprovado através dos documentos da PIDE.
Em 2004, fomos participar em Angola, num colóquio sobre as histórias de lutas de libertação nos Países Africanos da Língua Oficial Portuguesa (PALOP). Encontrei uma historiadora, cuja tese de Doutoramento do terceiro ciclo assentava-se sobre a PIDE/DGS relativamente a guerra colonial, na qual mencionou alguns documentos da PIDE sobre a evolução política e a existência de algumas organizações na Guiné. Mas nesta tese, estranhamente não apareceu PS-Partido Socialista. Não sei se foi extinto por razões da guerra fria, depois da Segunda Guerra Mundial ou se terá sido por causa da influência da Alemanha sobre Portugal ou ainda pela insegurança nas colónias Portuguesas. Se for esta a razão, mesmo o Partido Comunista também tinha idênticos problemas a ponto de criar Movimento da Unidade Democrática. Quer dizer, existiam núcleos nacionalistas, quer para autodeterminação, quer para a independência. Mas sempre ligados ao Partido Comunista português, sob apoio do Partido Socialista francês. E a equipa que foi à Conferencia da União Soviética sobre Partido Socialista nos anos 30 do século XX, foi financiada justamente pelo Partido Comunista francês.
Depois disso, veio o Movimento da Libertação da Guiné (MLG) e com o evoluir das coisas, seguiu-se até a Guiné-Conakry. Na altura, o Secretário para as Relações Exteriores era José Lacerda, pai do António Lacerda. Tinha ainda o João Rosa, igualmente Representante da CFAO, Companhia Francesa da África Ocidental, Rafael Barbosa, Secretário de Propaganda e das Massas. Talvez estas funções podem ter contribuído na promoção da sua imagem por ter estado em contacto permanente com a massa, mas estavam no movimento, brancos, pretos e mestiços muito bem conhecidos como Mário Lima Gomes Wanó e outros.
D: Foram nestas circunstâncias que o PAIGC nasceu?
MS: Em todas as pesquisas feitas por mim, o PAIGC não existia até antes de 1960. Mesmo 3 de agosto de 1959, não foi de autoria do PAIGC. Havia uma decisão de aumentar salário aos marinheiros do Porto. Acontece que um dia destes os Marinheiros se deslocaram ao chão dos Manjacos, a procura de paus para confeccionar remos e um deles foi ameaçado pelo Cão do António Cadeira, reformado e residente em Canchungo, o qual foi atingido mortalmente por um dos Marinheiros. Este senhor começou a atrasar com o processo de aumento de salário, porque talvez tinha ficado mal com a resposta dos estivadores. E, em reacção a atitude de António Cadeira, morreram em 1959, nove (9) pessoas, segundo arquivo histórico-militar português.
D: Será que o poder colonial, na altura, estaria tão interessado em revelar o número exacto dos mortos?
MS: Atenção, Portugal estava muito mal. Havia Movimento Democrático, Salazar estava esgotado e gozava apenas do suporte da PIDE. Portanto, havia muitos problemas ao ponto de Portugal ficar isolado, senão, Humberto Delgado não candidataria. As Nações Unidas, através de uma resolução, exigiram que os países colonizadores preparassem todas as suas colónias económica, cultural e politicamente, etc, num período de dez anos, antes de as deixarem. Foi, a partir desta altura, que Portugal começou a mudar de posição afirmando que não tinha colónias, apenas províncias. Nestas circunstâncias era normal que um regime colonial não fizesse relatório por sua conta própria, mas há testemunhas e até o Presidente português depois de António Espínola, Costa Gomes, Sub-Secretário da Aeronáutica portuguesa, na sua deslocação à Angola fez escala aqui no nosso país. Mobilizou comandos para o Aeroporto. Mas estes foram sem armas para o receberem com tiros de honra, uma tarefa desencadeada depois pelos Cepaios.
D: Há informações que indicam que antes do massacre de 03 de agosto de 1959 houve uma outra manifestação. Comenta?
MS: Não é do meu conhecimento, mas que eu saiba houve manifestação entre os Pepeis e Mancanhas na Feira da Praça que resultou em ferimentos de pessoas, reflexo da situação que a Guiné vivia na altura. Mas Portugal não tinha todo o território sob seu controlo, facto que o terá obrigado a reconhecer o poder tradicional antigo existente, antes do poder colonial português para poder ter monopólio do povo guineense. Voltando ao PAIGC, depois da deslocação das pessoas à Guiné-Conakry foram encontrados núcleos nacionalistas das outras colónias portuguesas, de Cabo-Verde, de Angola e do Moçambique. Estas pessoas informaram a Bissau da existência dos núcleos. Em 1960/61, criou-se MLGCV, Movimento de Libertação da Guiné e Cabo-Verde e a Frente de Libertação da Guiné Portuguesa e as Ilhas de Cabo-Verde com objectivo de fazer uma frente comum. Amílcar Cabral foi indigitado de Bissau à Conakry para aderir ao Movimento, simplesmente rejeitou, talvez porque, nesse momento, todos se conheciam, sobretudo, na dita sociedade civilizada em Bissau. Depois de desacertos no seio dos membros do Movimento, Luís Tchalumbé comunicou ao Rafael Barbosa para informar ao José Lacerda que havia necessidade de se enviar credencial, devido à confusão que se vivia em Conakry. Cadi Djaló (faleceu), comissária de Trânsito e responsável pela telecomunicação na altura em Bissau foi quem levou credencial que foi entregue ao Rafael Barbosa e um enfermeiro Ladislau de onde foi apagado o nome de Luís da Silva (Luís Tchalumbé) com uma substância e colocaram nome do Amílcar Cabral, argumentando que era guineense, africano, mas cedo não foi reconhecido. Algumas pessoas de Geba, por intermédio do Edmundo Dundo Fernandes, que se encontrava na administração da região de Bafatá, conseguiram um registo de nascimento (falso ou verdadeiro), que foi atribuído ao Amílcar Cabral como filho da Guiné-Bissau para justificar credencial. Havendo tudo isso, Sékou Touré ordenou para pôr fora todas as pessoas que não aceitaram aderir às iniciativas de Amílcar Cabral.
Tenho certeza que o programa político do PAI feito em Guiné-Conakry, teve mão dos Nánias que se encontravam na Guiné-Bissau. Porque sempre defenderam (Guineenses de Conakry), que a mãe de Amílcar Cabral era fula e por solidariedade étnica, Seifo lai Djaló terá ajudado a concretizar planos de Cabral. Alguns elementos do MLG, discordantes, espalharam demarcando. Uns pela Serra-Leoa e outros no Senegal (Casamança). Criou-se a FLING e, em seguida, iniciou-se a luta de libertação no norte de Santchabá, sector de São Domingos, em 1960/61. Frequentando a escola no Liceu Guinhabó Bigoló (colégio normal), segui primeiros tiros de armas do início da luta de libertação e só mais tarde, em 1966, saí de lá.
D: Por que é que não aderiu outros movimentos para além do PAIGC?
MS: Eu estava revoltado com a decisão da direcção do Liceu de Ziguinchor que atribuiu o concurso internacional de redacção aos estudantes originários da antiga colónia francesa em África. Eu e mais meu colega, Bapa Crade não aceitamos tomar parte e de vez em quando éramos castigados com sessões de estudos. Nesta altura, eram colados panfletos, mesmo assim não aderi ao concurso. Em 1963, em meados de Agosto, fui mobilizado por Queba Dabó quando tinha transitado para o décimo ano de escolaridade. Seguimos para Farim e encontramos Indjai Bá, encarregado de “Maison de Jeunes du Ziguinchor”, no antigo campo de futebol. PAI, com toda segurança, foi a partir deste conflito de Santchabá, sector de São Domingos que surgiu. Depois das divergências vividas no MLGC, antes de FLING, Amílcar começou a procurar aderentes e foi, a partir deste momento, que ele próprio Cabral viajou a Ziguinchor e realizou primeira reunião em 1962, na residência de Indjai Bá ao pé da mesquita central em direcção ao Santchabá, mas que, no entanto, não teve resultados bons, devido a falta de entendimento. Na reunião, estiveram presentes Bapa Lite, ex-irmão do Manuel Saturnino Costa, Mamadu Cantcham Camará (de RDA da Guiné Portuguesa) e uma mulher de nome Obidjara foram presos. Estavam os nove (9) partidos, organizações nacionalistas, UPG de Pipi Pereira, que não se entenderam. Primeiras armas chegaram da OUA com assinatura de François Kankola Mendy. No segundo encontro, realizado em Dakar, na presença do jovem cônsul-geral português, Gonzaga Ferreira, estiveram lá de novo, Papa Lite, Amílcar, Gazela (falecido) com a intenção de criar uma frente comum com duas hipóteses, independência pacífica ou independência por via das armas. Os nove (9) partidos, organizações nacionalistas com o rebentamento do MLG, cenário repetiu-se e até mais ainda do que o da Guiné-Conakry, acabando na criação de um outro Movimento “No riba kasa”. Na sequência de tudo isso, alguns decidiram ficar no Senegal e o Rafael viajou com a maleta do MLG e foi entregá-la ao Luís Cabral, um assunto que acabaria quase no seu espancamento. Porque tinha transportado consigo dezassete (17) mil escudos da Guiné para o encontro de Baobab (Senegal), informações que o próprio Rafael transmitiu aos elementos no encontro e que gravamos. Depois dele, Amílcar Cabral, foi ao terreno e não aceitou a proposta, mas o voto da maioria caiu no pensamento defendido pelo Léopold Sédar Sénghor e Amílcar abandonou a cimeira. Gonzaga Ferreira, cônsul-geral de Portugal em Dakar, informou Lisboa sobre ambiente vivido na conferência. Desde então, Professor Benjamim Pinto Bull (falecido) passou a chefiar as delegações das nove organizações políticas guineenses para a independência da Guiné. Na sua primeira deslocação a Portugal, o grupo foi recebido pelo Salazar e inclusive, pelas informações, Portugal tinha aderido a ideia de independência por via pacífica. Todavia, como GCE, parte que contestou o resultado da cimeira teve que levar muitas pessoas para cadeia para poder evitar o problema que se vivia no Senegal, porque Senghor também lutava contra o PAI do Senegal com consonância política comunista do PAI da Guiné.
D: Como explica esta situação de Amílcar Cabral ter criado um Clube Desportivo na Guiné, a revolta em 1959 e o roubo de seus óculos?
MS: Não conheço revoltas em 1959, nem estou contra alguém. Sou historiador e, tal como homem que se enveredou pela investigação, não significa de forma alguma que tudo em mim é perfeito. Mesmo esta história de roubo de óculos foi só uma questão de invenção para o prender. Rafael, na sua pessoa, faz posição do Cabral e o problema do Rafael e com a família de Amílcar é um problema adulto. Pai do Rafael tinha apelido Cabral e o próprio Rafael tinha Cabral, mas não se apresenta com apelido Cabral. Portanto, uma afinidade que chegou a ser tão forte ao ponto de Rafael Barbosa tornar-se genro de Juvenal Cabral.
D: Depois de 40 anos da morte de Cabral e 50 anos de início da luta de libertação assinalados recentemente, podia deixar aqui a sua análise sintética sobre estes dois acontecimentos em comparação à situação actual do país…
MS: Não se pode fazer uma análise da situação actual sem falar dos condicionantes da actual situação. É preciso ter um olhar atento ao passado, pois uma luta nacional é sempre uma congregação de sensibilidades, organizações e movimentos. O próprio Amílcar Cabral que, pela primeira vez, partidarizou do Movimento a partir de Cassacá, no qual o congresso nacional teve nome Cassacá, afirmava sempre que, “nem toda agente é militante do partido”. Ora, se todos os comandantes e Anciões que estavam no encontro fossem todos do PAI, Cabral não discursaria de tal forma. A Coabitação foi difícil, porquanto faltou um trabalho político profundo. O que facilitou a adesão dos guineenses é a sua característica antropóloga formatada para o seu Curriculum doméstico, não de ir a escola. Há uma certa solidariedade, aspecto que nos diferencia de outros povos da África Central, como Grandes Lagos, Burundi, Ruanda, por aí fora, Angola e Moçambique.
A título de exemplo, se repararem bem, desde a libertação, a ordem do dia a ser discutida no próximo Conselho de Ministros, vem à rua antes da reunião, portanto, é essa característica do guineense.
D: O que é que deu, depois tanta força ao PAIGC, ao ponto de Cabral passar também a ser uma figura incontornável não só para PAIGC, bem como a movimentos do terceiro mundo?
MS: Isso tem a ver com duas etapas. A primeira etapa interna e a segunda externa. Etapa interna, em Conakry, o MLG enfrentou dificuldades, o que levou a criação do MLGC e mais tarde MLGCB. Cabral levou dez mil dólares para Guiné-Conkcry, segundo fontes, família Trupin identificou-se logo com Cabral, porque pessoas que saíram de Bissau passavam fome e este homem aproveitou lançar a corrupção. Fala-se tanto da corrupção no PAIGC, o pai da corrupção no partido é o próprio Amílcar Cabral. Não dava dinheiro por gostar destas pessoas, mas dava para as puxar. Uma vez, o primeiro grupo que tinha aderido ao grupo de Amílcar encontrou-se com o segundo num restaurante, lançaram-se a muros. Mais tarde, o grupo abandonou a localidade de Sandrawalia e foi alugar um lar. Portanto, havia falta de maturidade nas pessoas e Nino era chamado de Morcego, porque não era visto de dia só aparecia à noite.
D: Mas tudo isso não tinha a ver também com a inteligência do próprio Cabral?
MS: Não. Repara, esses indivíduos não tinham um nível académico elevado. Eram os chamados assimilados e Cabral tinha grau superior. Aristides também era de nível baixa apenas tirou curso técnico de telecomunicações. Amílcar teve sorte, porque a sua ideologia política identificava – se com a linha do comportamento político do Ahmed Sékou Touré de Conakry – e este, por sua vez, conseguiu facilitar, porque também tinha boa relação com grandes líderes revolucionários da África, fundadores da OUA, como Mohamed V, pai do Assan II de Marrocos, Kwame Nkrumah de Ghana, Jomo Kenyatta do Quénia, Julius Kambarage Nyerere da Tanzânia, Kenneth Kawnda da Zâmbia, Mama Samba Debó do Congo entre outros líderes africanos, incluindo historiadores senegaleses que se refugiaram para Conakry, devido a política de Senghor e juntaram-se ao Sékou Touré, rejeitado por França. Ahmed Sékou Touré, por exemplo, não tinha essa política comunista, mas era sindicalista estratégico. Conseguiu influenciar e muito a actuação e formação do Cabral e até mesmo na condução dos assuntos políticos da Guiné, pois era um terreno fértil para ele. Tudo isso foi a nível interno. No plano Internacional, só Eduardo Mondlane era universitário e funcionário das Nações Unidas, então a revolução decorreu sob ritmo universitário da intelectualidade, enquanto Portugal ganhava terreno em Moçambique. Em Angola, Mário de Andrade mais um colega dele foram afastados do MPLA e rejeitados, porque eram considerados brancos. Mas, isso era o resultado dos problemas que se viviam também em Angola através de dois estrangulamentos.
Primeiro, porque os de norte e os do sul não se davam bem e várias vezes temos de intervir na ex-União Soviética para sanar divergências entre os estudantes do norte e os do sul na altura, mas todos do MPLA, da mesma organização partidária. Segundo estrangulamento, foi justamente a classe política do MPLA, os cremes (mestiços), que ajudou Amílcar a progredir. Estes mestiços eram identificados por angolanos com o regime colonial, por isso o MPLA não tinha uma força política consistente e nasceu UPA e mais tarde a UNITA, todos eles movimentos negros.
D: Durante alguns anos colaborou com Amílcar Cabral e, neste momento, apresenta-se como um dos críticos a esta figura. Tinha algum conflito com Cabral?
MS: No comité da secção dos estudantes do partido na União Soviética, SEP, só estavam os estudantes da associação dos estudantes da Guiné e Cabo-Verde do PAI, para além destes não havia nada mais. Eu enquanto responsável pelas finanças e problemas académicos, Cabral solicitou-me uma vez para responsabilizar da sua filha em 1968, mas numa reunião onde estavam figuras como Fernando Cabral, Paulo Medina e companhia limitada, Fernando Djibril fez a proposta de eu não assumir essa responsabilidade no SEP, porque era mais novo e com limitações na língua e que seria necessário ganhar mais experiencias para, no futuro, conhecer outras organizações estudantis da Europa, África e da Ásia. Em 1970, assumi plenamente as funções e, desde então, jamais consegui chegar às 08 horas às aulas. Sempre andei a resolver os problemas de vária ordem, do nível da escolaridade, pessoais, etc. Havendo cada vez mais problemas ligados a níveis de escolaridade tive que fazer voltar muitas pessoas para Guiné. Mais tarde descobri que grosso número deles era afinal agente da segurança, os informadores, talvez pode ser este o motivo que, em 1972, Cabral criticou-me fortemente.
D: Como é que analisa afirmação do jornalista José Pedro Castanheira que afirma no seu livro que Amílcar Cabral foi morto por militantes do PAIGC da Guiné-Bissau?
MS: Aristides Maria Pereira, Secretário-Geral do PAIGC na Guiné-Conakry, era adjunto de Amílcar Cabral, chefe dos serviços da secreta e Oto Chartte, era seu adjunto, todos cabo-verdianos. Enquanto figuras próximas do Cabral, por que é que não travaram o assassinato de Amílcar e tomar medidas contras essas pessoas? Será que não sentiram que se tal não tivesse acontecido a situação não os favorecia, porque eram minoria talvez? Por que é que não se levantou a questão da inacção da secreta dirigida por Aristides Maria Pereira para desmantelar a operação? Será que não se pode dizer que a inactividade da secreta, foi ou não um golpe palaciano?
Na altura quem tinha a ideia diferente a dos Cabo-verdianos, era logo tratado de inimigo de Cabo-Verde. Se a tese de Amílcar Cabral fundamenta-se essencialmente sobre o papel da cultura, por que é que os seus sucessores, Aristides Maria Pereira e Luís Cabral fecharam o Museu? Talvez tenham lembrado das indicações deixadas por Amílcar Cabral, que a cultura é um factor conspirativo e de libertação. Ou talvez entendeu-se que o povo guineense vendo o seu Museu étno-histórico a funcionar poder-lhe-ia servir no futuro de referência para reagir face as matanças sistemáticas cometidas e prisões ilegais sem advogados.
Será que eram fiéis ao Amílcar Cabral, iam estragar a memória de Cabral sobre a vertente cultural? Por que é que, em Cabo-Verde, foram conservados todos os monumentos históricos e até avenidas coloniais foram igualmente conservadas e na Guiné-Bissau nada disso restou. Luís Cabral chegou a fazer proposta com perícias do Breda-UNESCO, para a elaboração de um projecto sobre a lei de protecção do património cultural, nada foi feito até 14 de novembro de 1980. Portanto, Octo Chardt foi morto, porque alguém receava que pudesse um dia dizer ao público o seu segredo.
Depois da morte de Cabral produziu-se uma lista de centenas de pessoas até inocentes foram executadas, outras foram queimadas. Chamavam as pessoas, um por um, como foi com o caso de 17 de outubro em Bissau e todos eram filhos da Guiné-Bissau, nenhum Cabo-Verdiano.
D: O relatório sobre a morte de Cabral chegou ser apresentado publicamente?
MS: Está nos serviços da segurança guineense, no Ministério do Interior, se não for roubado, incluindo o dos guineenses mortos na sequência da morte do Amílcar Cabral.
D: Como considera o Cabral?
MS: Cabral é um grande estratégico e históricamente não se pode negar isso. Também soube aproveitar os homens que tinha ao seu dispor e, muitas das vezes, mesmo na sua ausência, os seus homens conseguem executar correctamente os planos no terreno e sem grandes dificuldades.
D: Será que a sua liderança não influênciou o processo da luta?
MS: Sabemos que todos os relatórios são dirigidos por ele e para depois o Conselho da Guerra venha decidir. Conheço o Cabral um pouco e ele não me faz mal. Mas vocês também podem se questionar: Como morreu o comandante Domingos Ramos? Fizeram muitas invenções sobre a morte de Domingos Ramos e dizem isso e mais aquilo. Domingos Ramos, Paulo Correia e mais outros camaradas fizeram exército colonial. Imaginam uma pessoa com a experiência militar vai utilizar o morteiro 60 numa distância de menos de 200 metros. Bem eles é que dizem e há que esclarecer muitas coisas nesta terra.
D: O que acha que pode ser feito a fim de permitir ao país sair da situação em que se encontra?
MS: Para o nosso país sair da situação instabilidade e de cíclicos sobressaltos, acho que temos que organizar uma grande conferência nacional de reconciliação entre os guineenses e na qual as pessoas irão confessar aquilo que fizeram e, para depois, serem amnisteados dos crimes cometidos. A realização de uma conferência nacional de reconciliação é a única via para resolução dos problemas, mas atenção: não se pode ser dirigida por pessoas implicadas nos problemas que passaram neste país ou as pessoas pertencentes a algumas organizações e que já estão afectadas das sujeiras dos problemas deste país. A conferência deve ser dirigida por pessoas neutras de todos os problemas que passaram na Guiné-Bissau e que não estão implicadas em nenhum acto de corrupção, porque conhecemo-nos todos aqui e sabemos todos quais são as pessoas sujas neste país.
D: Que leitura faz sobre o congresso do PAIGC agendado para o próximo mês de Maio?
MS: Será um congresso de decotados, ou seja, vai ser feito para os meninos bonitos. Mas agora se a partir do momento existirem meninos bonitos e será que haverá a justiça? Para já não vai pautar pela promoção da competência, a fim de permitir o mais capaz dirigir o partido ou através da participação de todos os militantes e dirigentes.
D: Passaram muitos assassinatos neste país. Acha que a justiça guineense será capaz de trazer a luz do dia os responsáveis desses actos?
MS: Acho que é dificil, mas as autoridades judiciais têm que ter a coragem de fazer vincar a justiça. Digo que isso vai ser difícil se tomarmos em conta o nível da corrupção que se regista no sector da justiça e por isso aposto na realização de uma conferência nacional de reconciliação, onde os responsáveis de sucessivos actos dos crimes terão a coragem de confessar aquilo que fizeram, para depois serem amnisteados pelo povo.
D: Há vozes que indicam que os chefes relegiosos deveriam ser incumbidos a tarefa da realização da conferência nacional de reconciliação, dado que são neutros de todos os problemas. Compartilha essa ideia?
MS: Vários chefes religiosos são corruptos e sei disso muito bem. Como é que vão confiar os chefes relegiosos essa tarefa se a própria sociedade desconfia dos mesmos pelos actos da corrupção. Os chefes relegiosos que fazem desvios dos donativos para os seus interesses pessoais, prejudicando a sociedade.
D: As Forças Armadas hoje são um problema para a Guiné-Bissau?
MS: Não. As pessoas que hoje estão nas forças armadas uma boa parte são meninos que assistiram os sacrifícios que os seus pais (combatentes) passaram nesta terra. Será que vão admitir ou aceitar que os políticos brinquem com eles da mesma forma? Os sucessivos governantes tratam os combatentes como escravos e até têm a coragem de os pagar um salário mensal de 15 mil francos CFA. Nesta situação, acham que as pessoas que estão a liderar as forças armadas vão admitir falta de respeito desses bandidos. Porque sabem como é que os seus colegas foram tratados e, por isso, muitos combatentes não querem ir a reforma e prepeferem ficar no quartel para ganhar um pouco de salário.
Por: Assana Sambú/Filomeno Sambú
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