LIBERTAR A JUSTIÇA
Doka Internacional, tem alertado que “a paz é fruto da justiça”. Isso, de facto, é a verdade mais nítida
que já escutei na minha vida. O que significa que a injustiça - ou ausência da
justiça – tende a gerar instabilidade na comunidade política. O imbróglio
político tende a ser cíclico.
A questão da justiça volta estar no centro das disputas políticas
internas. O que confirma que os verdadeiros fatores de instabilidade na nossa
terra nunca foram os militares, questões étnicas ou até o narcotráfico. Nunca! Continuamos
a defender os anátemas que acabamos de referir, sempre serviram de álibi para os
contendores. E, sobretudo, para os vencidos nas lutas palacianas.
Era miúdo, mas recordo-me muito bem como o sistema político na
Guiné-Bissau abafou o princípio do contraditório
na justiça, retirando ao Poder Judiciário a capacidade de atuar de forma
separada, independente e harmoniosa com outros poderes. Obstrução da justiça
era apanágio do regime de partido único. Mesmo assim, na democracia
multipartidária, a justiça continuava a claudicar. Porque a mudança política
que se impunha não fazia parte da agenda do tirano. Ela era espiada.
A injustiça - ou ausência da justiça – empilhada durante
décadas de 80-90, viria a confluir na guerra de 7 de Junho de 1998. No centro
da controvérsia residia mandado de captura (sem notificação judicial oficial) assinado
por Nino Vieira, contra Ansumane Mané, acusando-o de tráfico de armas para os
rebeldes MFDC. De referir que o duplo assassinato de Nino Vieira e Tagmé Na
Waié, em Março de 2009, terá sido motivado pela desforra política, decorrente do
conflito político-militar que durou onze meses.
Logo a seguir a esse período, a justiça volta à ordem do dia.
Pois, havia um silêncio ensurdecedor por parte do poder político em Bissau, em
termos de esclarecimento político. Não apenas derivada à necessidade de reivindicação
do crime, das mortes (ou assassinatos) de duas figuras políticas proeminentes, Nino
Vieira e de Tagme Na Waie, mas, também, de outros destacados dirigentes
políticos da nossa praça (Nicandro Pereira Barreto, Hélder Proença, Baciro
Dabó, Roberto Cacheu, Yaia Dabó, Samba Djaló, entre muitos outros). Porque, ao
Estado, presume-se que seja pessoa de bem. O Dr. Amine Saad, antigo
Procurador-geral da República, graças a Deus está de vida e não nos deixa
mentir. Os clamores de manifestantes apelando à justiça encima de plataformas móveis,
marchando à partir de “Chapa Bissau” em direção ao Ministério Público, dividiu,
na época, a sociedade guineense entre os que apoiavam a elucidação dos casos e
condenação dos assassinos pela justiça e os que estavam do lado oposto da
barricada. As duas correntes eram, curiosamente, representadas (ou até protagonizadas)
pelas altas figuras do Estado. De um lado, o ex-Presidente da República, Malam
Bacai Sanhá (aliado dos manifestantes) e do outro, o ex-Primeiro-ministro,
Carlos Gomes Júnior (adverso aos manifestantes). Por causa da injustiça – ou
ausência da justiça - as fricções política entre os antagonistas terá derivado na
morte do ex-Presidente da República Malam Bacai Sanhá, em Janeiro de 2012.
Facto que, por seu turno, também, terá contribuído, posteriormente, e de foram
decisiva, para o derrube de Carlos Gomes Júnior, três meses depois.
Hoje, como sempre esteve, a injustiça - ou ausência da
justiça - volta a estar na ordem do dia. Os políticos corruptos não querem soltá-la.
Neste momento, o que se sabe é que o
Ministério Público, na qualidade de advogado do Estado, dentro das suas
limitações e proficiência, sempre fez o seu trabalho. O Poder Judiciário sabe
quanto a casa gasta em matéria de corrupção política. E se tivesse havido,
sempre, colaboração político-institucional, a verdade dos factos teria sido
desvendada e o nosso aparelho de Estado estaria limpo, e não é de agora. O curioso
é que a história se repete. Nos casos de corrupção na gestão de coisa pública
que envolve ministros do atual Governo, enquanto o Presidente da República,
José Mário Vaz se mostra aliado do Ministério Público, à favor desta campanha
de higiene e saneamento da casa, o Primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira,
procura, a todo custo, imiscuir-se nos trabalhos desta instituição, com
comunicados políticos aberrantes, intimidatórios e requerimentos assanhados à
Assembleia, para tentar de alguma maneira comover a opinião pública nacional e
internacional.
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