A FORÇA DA RAZÃO 1
OS “15” E A DISCIPLINA PARTIDÁRIA
O reconhecido esforço milenar do
homem em estabelecer regras que lhe permitam viver de forma organizada,
independentemente do tipo, da forma e do carácter da sociedade em que estiver
inserido, assim como do grau do desenvolvimento dessa mesma sociedade, tem uma
explicação óbvia: A SOCIEDADE ORGANIZADA, FUNCIONA!
Por
outras palavras, o sucesso dos povos na edificação social, acaba por ser
directamente proporcional a sua capacidade e disponibilidade de estabelecer e
cumprir de forma voluntária e intransigente Leis e Regras de interacção e
convivência social, que visam antes de mais, a observância dos Direitos e
Deveres individuais e colectivos, baseados no respeito, na tolerância face às
ideias, opiniões e opções não necessariamente coincidentes e na assunção de
responsabilidades cívica e moral face às opções tomadas e aos demais valores
aplicáveis, atribuindo assim uma maior eficácia ao desempenho colectivo, com
base na previsibilidade do comportamento individual.
Sendo um dos Países potencialmente mais ricos
do Continente africano, com uma população relativamente pequena (estimada em
menos de dois milhões de habitantes), a Guiné-Bissau debate-se com uma situação
de extrema pobreza, mormente explicada pela sua desorganização estrutural e a
caoticidade do funcionamento das suas Instituições em todos os níveis, dando
origem à fenómenos tão constrangedores do progresso e desenvolvimento
socioeconómico, como a corrupção generalizada, o suborno quase
institucionalizado, o enriquecimento ilícito, a delapidação do erário público
em benefício pessoal, familiar e corporativo, o amiguismo, o tribalismo, o
regionalismo, devidamente protegidos pela maldita impunidade que ameaça as
nossas conquistas históricas e condena ao fracasso todo o nosso esforço de
afirmação nacional.
Nesta ordem de ideias, é de aplaudir todo e
qualquer esforço tendente a inverter esta vergonhosa situação, que mina a
dignidade do nosso povo, coloca em risco a estabilidade social, o princípio de
solidariedade entre indivíduos que naturalmente partilham o mesmo espaço de
convivência, a segurança do Estado e a própria soberania nacional, reconhecendo
que, à semelhança dos outros Países, as perspectivas dum desenvolvimento
sustentado na Guiné-Bissau, passam impreterível e prioritariamente pela
impecabilidade da organização e do funcionamento das componentes estruturais da
sua sociedade.
Em todo o Mundo existem Partidos Políticos,
que no fundo, são organizações de Massas, integrados por indivíduos que se
propõem organizar segundo determinados conceitos e que lutam pela conquista do
Poder Politico, que lhes atribui a prerrogativa de gerir os destinos das
respectivas Nações, durante um período de tempo rigorosamente estabelecido nas
respectivas Constituições. São estes Partidos que mediante os seus programas,
assumem as tarefas de propor o modelo de organização social que melhor se
enquadra nas tradições histórico-culturais dos seus povos e incrementar o
desenvolvimento, com base nas potencialidades nacionais existentes, nas
ferramentas realmente disponíveis, tendo em conta as realidades de um Mundo em
constante progresso. Sendo que a excelência da organização destes Partidos
acaba por reflectir no grau de organização das sociedades que representam.
É nessa perspectiva que o estado de
precariedade prevalecente na Guiné-Bissau é objectivamente considerado um
reflexo da desorganização interna do PAIGC, o maior Partido Político do País,
que desde a independência tem praticamente estabelecido o monopólio do Poder,
sem conseguir no entanto acompanhar a dinâmica da evolução política e
ideológica mundial, perdendo-se no imenso turbilhão de acontecimentos
provocados pela desintegração da antiga União Soviética.
Fortemente fustigado por lutas intestinais,
que prometem se tornar cada vez mais intensas, à medida que se aprofunda o
fosso da miséria no País e o exercício político se consagra como tábua de
salvação ou simplesmente como meio mais acessível e apetecível de participar na
partilha ilícita do pouco que ainda resta da “riqueza nacional”. Ao longo dos
45 anos do seu turbulento reinado, caracterizado essencialmente por graves
violações dos Direitos Humanos, torturas, assassinatos, corrupção, saque, abuso
do poder e demais formas do aviltamento da consciência social e moral do homem,
o PAIGC nunca se dignou propor ao seu povo um projecto consistente de luta pela
sua emancipação, pela sua dignificação e inserção no contexto das Nações livres
e progressistas do mundo.
Neste contexto, seria absurdo não reconhecer
no PAIGC e nos seus sobressaltos o fulcro dos males que afectam a Guiné-Bissau.
Por isso, quando a actual Direcção do Partido de Amílcar Cabral decidiu pôr
ordem em casa, proclamando a luta pela estrita observância da disciplina
partidária como uma das suas prioridades, foi entusiasticamente saudado tanto
pelos seus militantes, como pelo povo em geral, na esperança de que não seria
mais uma mera e pomposa declaração de boas intenções do Presidente do Partido,
mas que na realidade era desta que o PAIGC deixaria de ser um pesadelo para o
nosso Povo e um entrave à estabilidade e ao progresso socioeconómico do nosso
País (desde a implantação do sistema multipartidário na Guiné-Bissau, que
nenhum Governo conseguiu cumprir o seu mandato, em virtude das clivagens que
fustigam o PAIGC e acabam por abranger toda a sociedade).
Entretanto, restava saber de que ferramentas
dispunha o Presidente do Partido e qual a sua eficácia, para levar à cabo uma
tarefa tão almejada, mas que pela sua complexidade e caducidade, exigia uma
atitude prudente com base numa minuciosa analise das causas geradoras da
indisciplina partidária e zelar para que em nenhum momento essa definição
(disciplina partidária) fosse confundida com o direito inalienável dos
militantes se organizarem em sensibilidades cujos ideais não se antagonizam com
a linha mestra das orientações definidas pelo Partido e evitar que a fórmula
encontrada para a combater engendre polémicas e problemas ainda maiores,
deixando transparecer que estamos perante uma caça às bruxas.
RECORRER Á INDISCIPLINA PARA
COMBATER A INDISCIPLINA
O Nº 1 do Artigo 16º dos Estatutos do PAIGC
impõe a obrigatoriedade dos Governos deste Partido submeterem os seus programas
de governação à apreciação e aprovação do seu Comité Central, antes de serem
apresentados à análise, discussão e votação na Assembleia Nacional. E foi isso
mesmo que aconteceu quando o Eng.º Domingos Simões Pereira foi eleito Chefe do
Governo e o seu programa fora unanimemente aprovado tanto pelo Comité Central
do seu Partido, quanto pelos Deputados que o representavam na Assembleia
Nacional.
Entretanto, por força do destino, um ano
depois o Governo então liderado pelo Eng.º Domingos Simões Pereira foi demitido
pelo Presidente da República e em seu lugar foi nomeado um novo Chefe de
Governo (o Dr. Baciro Djá) e empossado um novo elenco governativo, que por sua
vez não durou mais de quarenta e oito horas, por ter sido declarado
inconstitucional por um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que exigia a
devolução do Poder ao PAIGC, enquanto Partido vencedor das últimas eleições e
detentora duma maioria absoluta na Assembleia Nacional.
Por conseguinte, o PAIGC decidiu avançar com
a figura do Eng.º Carlos Correia para chefiar o novo Governo. Falando de
um novo Governo, estávamos a falar impreterivelmente de um novo ciclo de
governação que pressupunha o cumprimento integral dos procedimentos plasmados
no supra-mencionado Nº1 do Artigo 16º. Ou seja, para ser vinculativo aos
Deputados do PAIGC, antes de ser submetido à Assembleia Nacional, o Programa do
novo Governo, agora chefiado pelo Eng.º Carlos Correia, devia ser submetido à
uma ampla discussão e aprovação no Comité Central do Partido. Entretanto, foi
precisamente neste ponto que a contradição atingiu o seu auge, fazendo detonar
a bomba: o Eng.º Domingos Simões Pereira, na qualidade de Presidente do
Partido, recusou-se categoricamente a cumprir este procedimento estatutário,
alegando que, há um ano atrás, o referido programa já tinha sido aprovado pelos
Membros do Comité Central, pelo que não havia necessidade de voltar a fazê-lo,
apesar da reconhecida mudança de conjuntura. Neste caso questiona-se o
seguinte:
Se há um ano atrás à semelhança do Comité
Central, esse mesmo Programa também já tinha sido aprovado na Assembleia
Nacional, para quê submetê-lo de novo à apreciação e votação dos Deputados? Não
era melhor considera-lo automaticamente aprovado e o Governo automaticamente
legalizado?
Não! Porque Domingos Simões Pereira precisava de um
pretexto, mesmo que não fosse plausível, para se livrar dos possíveis
concorrentes no Partido.
Perante a irredutibilidade do Presidente do
PAIGC face à essa decisão, quinze (15) dos seus cinquenta e sete (57) Deputados
deixaram claro que se o Programa do Governo fosse apresentado à Assembleia
Nacional sem passar pelo Comité Central, estaríamos perante uma flagrante
violação dos Estatutos do Partido e que neste caso não esse Programa não os
vinculava e eles iriam abster-se no momento da sua votação. E foi literalmente
isso que aconteceu: O Programa foi submetido à Assembleia Nacional sem
passar pelo Comité Central, os quinze (15) votaram abstenção e o Programa foi
chumbado e os 15 Deputados foram expulsos do Partido, que por conseguinte
perdeu a sua maioria parlamentar à favor da oposição que agora Governa o País
com toda a legitimidade.
Perante este facto, coloca-se a seguinte
questão: QUEM FOI O CULPADO DA DRAMÁTICA SITUAÇÃO NO PARTIDO E DA CRISPAÇÃO
INSTITUCIONAL QUE HOJE SE VIVE NO PAÍS?
O Eng.º Domingos Simões Pereira tinha
começado da pior maneira a sua declarada guerra à indisciplina partidária, revelando-se
um exímio violador dos Estatutos e consequentemente o militante mais
indisciplinado do PAIGC. Um exemplo disso, foi a forma anti-estatutária,
ditatorial e tendenciosa como organizou as Conferências das Secções, das Zonas,
dos Sectores e das Regiões, que culminaram com a realização de um Congresso em
que ele se apresentou como único candidato à liderança do PAIGC.
Convém sublinhar que a expulsão dos quinze
Deputados afectos à Bancada Parlamentar do PAIGC, não tem absolutamente nada a
ver com a violação da disciplina partidária. Foi apenas uma flagrante
oportunidade devidamente aproveitada pelo Presidente do Partido e seus
seguidores, obedecendo à uma sofisticada estratégia que visa salvaguardar os
seus interesses através da sumária expulsão de todos os Dirigentes que do seu
ponto de vista, constituem uma ameaça muito séria à sua liderança hegemónica.
Um bem-haja à Guiné-Bissau e ao nosso povo!
EDP – Mantenhas de Portugal para o quatro
cantos do Mundo!
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.