domingo, 15 de julho de 2018



Dr. Sancum Camará


AS FINANÇAS PÚBLICAS AO SERVIÇO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO DA GUINÉ-BISSAU

 O rigor e a eficiência na gestão do dinheiro público, como forma de garantir a sustentabilidade económica e financiar o desenvolvimento.

Pretende-se com este artigo dar a conhecer a importância de uma gestão rigorosa e eficiente das finanças do Estado como forma de garantir a sustentabilidade económica e o desenvolvimento, assim como indagar os impactos das principais reformas financeiras.

Do ponto de vista económico, as finanças públicas é o sector vocacionado na captação e gestão de recursos financeiros com vista a facilitar o funcionamento das instituições do Estado e dinamizar os diversos sectores da actividade macroeconómica, tendo o bem-estar coletivo, como objetivo sagrado.

A Gestão das finanças públicas e a sua importância.

De uma forma bastante objectiva, pode dizer-se que Finanças é um ramo da ciência económica que tem como objecto de estudo o “dinheiro” e a sua circulação, ou seja, a sua origem e, consequentemente, a sua afectação. O termo público diz respeito ao que é comum a toda a sociedade ou Estado. Assim, “Finanças Públicas” trata de toda a circulação e gestão do capital público, desde a sua arrecadação, passando pelo planeamento e execução, até o controlo e fiscalização.

Num momento em que a economia mundial caracteriza-se sobretudo pela incerteza, onde as principais potências internacionais têm apresentado sucessivas quedas no crescimento económico, influenciando de uma forma directa a dinâmica económica a nível global, o rigor e a eficiência na gestão das finanças públicas, ganham cada vez mais importância para a sustentabilidade económico-financeira de qualquer país, tanto que, actualmente, se assumem como as únicas formas de estimular o crescimento e o desenvolvimento de um Estado, independentemente do nível de desenvolvimento deste.

Esta ideia ganha ainda mais força quando se trata de uma pequena nação, como a nossa, sem grandes capacidades financeiras, a iniciar a maratona do desenvolvimento, como é o caso de Guiné-Bissau, que se caracteriza notadamente pela sua vulnerabilidade económica e pelo constante défice financeiro. Hoje, podemos ver um pouco por todo o mundo, no seio dos países ditos desenvolvidos, a atenção que é dada à Gestão Financeira Pública, tanto pelas políticas financeiras que são adoptadas, como pelas medidas materializadas, sempre com o intuito de impulsionar a economia e banir ou minimizar o défice financeiro, tudo isso, em prol da sustentabilidade económica.

As consequências de uma má gestão do dinheiro público, como algumas práticas recentes demonstram, podem ser catastróficas, tanto do ponto de vista económico, como social, para qualquer país, independentemente do seu poderio económico. Podemos tomar como exemplo o caso da Grécia, que dispensa quaisquer comentários. 
Isso só para demonstrar a relevância de uma gestão financeira eficiente, sustentável e responsável, não só para o progresso de um Estado, mas também para a consistência económica mundial, visto que com a globalização e a internacionalização económica, as crises financeiras podem ser contagiantes. Neste sentido, a economia internacional pode ser vista como um grande sistema, composto pela economia de cada país, continente ou organização internacional, onde os erros de uns abalam o bom funcionamento de todo o sistema e afetam todos.

A gestão das Finanças públicas na Guiné-Bissau.

Como país jovem que é, a Guiné-Bissau vem ao longo do tempo tentando aprofundar as suas raízes nos terrenos da democracia e da boa governação, que são e têm sido a sua marca e cartão-de-visita no mundo. Independentemente das suas divergências, os sucessivos governos e forças políticas que vêm dirigindo o país até à data, não conseguiram construir um Estado transparente, justo e de oportunidades. 
Não obstante, os tempos, os intérpretes, as condições e as dificuldades são diferentes, o que faz com que os resultados sejam diferentes. 
Graças ao trabalho de todos, são visíveis os primeiros sinais de um país em plena evolução, apesar de tantos obstáculos na transparência, com oportunidades e com uma economia que apresenta muitas perspetivas, falta muito para fazer neste sentido.

Tem-se recorrido a empréstimos e contração de créditos, embora segundo os responsáveis, com um nível de juro baixo e a longo prazo, como forma de obter o meio de financiamento para os investimentos públicos necessários para a dinamização da economia, o que justifica a dívida pública da Guiné-Bissau, superior à nossa força produtiva. Esse facto torna imperativo que sejamos rigorosos e eficientes na forma como gerimos os nossos recursos, por dois motivos:

1.    Primeiro, porque com o elevado nível de endividamento já não temos muita margem para contrair mais créditos para possíveis necessidades, visto que existem imprevistos e situações de calamidade;

2.    Segundo, porque precisamos de meios para cumprir não só com os compromissos junto dos credores, mas também os compromissos internos, relativos ao funcionamento do estado e as necessidades do coletivo.

A melhor forma de garantir a sustentabilidade económica na Guiné-Bissau, isto é, ter capacidade financeira para fazer face aos compromissos e proporcionar o normal funcionamento do Estado, passa por ter como princípios fundamentais o rigor e a eficiência, quando se fala em gestão dos escassos recursos que temos. Nessa óptica, o governo tem entre vários desafios, dois principais, a saber:

1.   Garantir a melhor afectação possível dos recursos – de acordo com as necessidades, isto é, ter claro as prioridades relativamente aos investimentos públicos, levando em conta a relação entre o custo e a utilidade social, como forma de minimizar os desperdícios e investimentos não reprodutivos;

2.   Combater a corrupção e o esbanjamento de capital que é feito na função pública.

Na Guiné-Bissau, nos últimos tempos, tem sido bastante problemática a questão orçamental, que constitui um dos factores na origem das fragilidades institucionais do país, as políticas públicas inadequadas em diversos sectores da actividade do Estado e que conduziram a uma desestruturação do próprio Estado.

Sobretudo, num momento em que, com a adesão do país à UEMOA, se abdicou de alguns instrumentos da política económica, nomeadamente, as políticas monetária e cambial, restando-lhe tão-só a política fiscal, que tem sido o calcanhar de Aquiles de sucessivos Governos, cuja ausência de vontade política de se proceder a uma reforma fiscal profunda que permita arrecadar mais receitas para fazer face às suas despesas correntes ficou bastante patente. Eis as causas de um dos males actuais das nossas finanças públicas, que podem ser eliminadas com a promoção de reformas fiscais consistentes e coerentes. Fundamentalmente, executando políticas e práticas corretivas na nossa administração fiscal.

A Guiné-Bissau é o país membro da UEMOA, com menor execução fiscal (8,76%) em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), estimado em pouco mais de 500 mil milhões de FCFA.

O quadro das nossas finanças públicas é, deveras sombrio: as nossas receitas arrecadadas são insuficientes para cobrir as despesas correntes do Estado, nomeadamente, para pagamento de salários dos seus funcionários e servidores e, muito menos ainda, para o funcionamento mínimo do aparelho do Estado.

A captação de recursos pelas finanças públicas comporta duas vertentes:

1.   Arrecadação de receitas provenientes de taxas sobre bens e serviços e/ou imposto sobre rendimentos dos agentes económicos (salarios e/ou lucros de empresas);

2.   A dívida doméstica e a dívida externa, quer dizer, junto dos organismos de cooperação bilaterais e de instituições financeiras supra nacionais, como por exemplo, os parceiros da Bretton Woods.

A primeira vertente da arrecadação de recursos difere da segunda vertente, por ser a alavanca endógena do crescimento económico, sustentável, na medida em que ela é a resultante da dinâmica de produção interna – efeito indirecto positivo do mercado de trabalho.

O recurso à segunda vertente, da captação de recursos pode ser analisado em dois prismas, sendo o primeiro de dimensão complementar e, o segundo, de dimensão antagónica à primeira vertente da arrecadação de recursos.

Quando for necessário acelerar o crescimento económico porque a redução do gap (diferencial) entre o nível real do PIB e o nível potencial do mesmo for significativo, então, as duas vertentes de arrecadação e captação de recursos agem de forma complementar. Todavia, recorrer à segunda vertente de captação de recursos quando a primeira se revelar eficaz é como administrar antibiótico a um organismo humano livre de doenças, ou, proceder a transfusão sanguínea ao corpo humano que não padece de doença nenhuma, tão pouco de anemia.

No contexto da Guiné-Bissau, considerando o frágil dinamismo da actividade económica assim como o nível marginal dos principais indicadores macroeconómicos (emprego, inflação, consumo, investimento, balança comercial, etc.), consta não haver contradições, evidentes, quanto às duas vertentes (arrecadação e captação) de recursos financeiros, para alavancar a actividade económica com vista à melhoria do bem-estar colectivo.

Não obstante, sublinhamos a nossa preocupação quanto à gestão da dívida externa porque, só dela podemos falar, visto não existirem dados sobre a dívida interna. Numa economia de rigor e de comprometimento civico, a dívida, seja ela interna ou externa, orçamenta-se ao serviço do crescimento económico e do bem-estar do cidadão. Não adianta comprometer os desígnios da Pátria com a espiral da dívida externa improdutiva que compromete o futuro das gerações vindouras. Endividamento é sempre útil quando a sua gestão se revela eficiente e portadora de resultados tangíveis de crescimento económico e de melhoria do bem-estar do guineense.

Ainda estamos a tempo para que a dívida guineense seja o motor do crescimento económico e do bem-estar dos guineenses.

Sancum Camará

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